TC – Processo nº 405/2023 ; Acórdão 469/2024
Em julgamento do último dia 19 de junho de 2024, a 1ª Secção do Tribunal Constitucional, em votação não unânime, decidiu pela inconstitucionalidade de norma do Regime que cria o Adicional de Solidariedade sobre o Setor Bancário (ASSB).
A matéria suscitada trata da inconstitucionalidade da norma contida nos artigos 21.º, n.º 1, alínea a), da Lei n.º 27-A/2020, de 24 de julho, no segmento que se refere ao cálculo do imposto relativo ao primeiro semestre de 2020; bem como das normas contidas nos artigos 1.º, n.º 2, 2.º e 3.º, n.º 1, alínea a), do Regime que cria o ASSB, contido no Anexo VI da Lei n.º 27-A/2020.
O ASSB incidiria sobre as instituições de crédito cuja sede principal e efetiva da administração se encontre em território português, as filiais em Portugal de instituições de crédito que não tenham a sua sede principal em Portugal, e as sucursais em Portugal de instituições de crédito com sede principal e efetiva fora do território nacional. Trata-se de tributo que incide sobre entidades não alcançadas pelo Imposto sobre Valor Acrescentado (IVA).
O ASSB incide sobre o passivo das entidades do setor bancário, nos termos do artigo 4.º do Anexo VI da Lei n.º 27-A/2020. O passivo destas entidades constitui “conjunto dos elementos reconhecidos em balanço que, independentemente da sua forma ou modalidade, representem uma dívida para com terceiros”.
O TC considerou que o ASSB possui natureza jurídica de imposto, pelo que estaria sujeito à regra irretroatividade em matéria tributária, nos termos do artigo 103.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa. A este respeito, a previsão contida na norma aponta que o adicional deve ser calculado “por referência à média semestral dos saldos finais de cada mês que tenham correspondência nas contas relativas ao primeiro semestre de 2020 , e, sendo assim, o facto gerador do pagamento do imposto verifica-se em momento anterior à entrada em vigor da lei, que ocorreu no dia seguinte à sua publicação”, não se ajustando à regra constitucional da irretroatividade.
O Acórdão nº 469/2024 considerou ainda estar violado o princípio da igualdade tributária. A este respeito sublinhou-se que o ASSB visa reforçar os mecanismos de financiamento do sistema de segurança social, como forma de compensação pela isenção de IVA aplicável à generalidade dos serviços e operações financeiras, e incide sobre instituições de crédito sediadas em território português e filiais ou sucursais em Portugal de instituições de crédito com sede principal e efetiva fora do território português. A incidência do ASSB apenas no que toca às instituições de crédito não se justificaria, pois não seria possível “determinar objetivamente o critério de diferenciação que conduziu o legislador a sujeitar as instituições de crédito a um imposto especial sobre o setor bancário, nem é possível discernir qual a sua real fundamentação”. Desta feita, o ASSB configurar-se-ia “como uma diferenciação arbitrária na medida em que o critério utilizado não apresenta um mínimo de coerência nem se encontra materialmente justificado”.
Por fim, a decisão tratou da violação do princípio da capacidade contributiva, vez que não estaria em causa qualquer modalidade de tributação do rendimento, mas apenas “a sujeição a imposto de uma parte das componentes do passivo”, “a ausência de correspondência entre o ASSB ‘e um concreto índice de valoração de capacidade contributiva coloca em causa a viabilidade constitucional do imposto’”, Assim como a ausência de relação “entre a incidência real do imposto e os fatores que possam revelar uma maior capacidade contributiva, quando é certo, como se deixou dito, que o critério de repartição do imposto, na hipótese, corresponde a uma lógica de solidariedade assente no falso pressuposto de que as instituições de crédito poderão suportar um agravamento da carga fiscal porque se encontram isentas de IVA relativamente aos serviços financeiros que prestam”.
Desta forma, as mencionadas normas decorrentes da Lei n.º 27-A/2020 foram consideradas inconstitucionais por violação do princípio da proibição da retroatividade dos impostos, decorrente do artigo 103.º, n.º 3 da Constituição da República Portuguesa, bem como os princípios da igualdade, na dimensão de proibição do arbítrio, e da capacidade contributiva, enquanto decorrência do princípio da igualdade tributária.
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Texto integral do Acórdão disponível aqui.